E porque este poema também já me assentou na perfeição...
Vai por mim...
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
              e não encontro nada.
              Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
              Era como se todas as coisas fossem minhas:
              quanto mais te dava mais tinha para te dar. 
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
              e eu acreditava.
              Acreditava,
              porque ao teu lado
              todas as coisas eram possíveis.
              Mas isso era no tempo dos segredos,
              no tempo em que o teu corpo era um aquário,
              no tempo em que os meus olhos
              eram peixes verdes.
              Hoje são apenas os meus olhos.
              É pouco, mas é verdade,
              uns olhos como todos os outros. 
Já gastámos as palavras.
              Quando agora digo: meu amor...,
              já se não passa absolutamente nada.
              E no entanto, antes das palavras gastas,
              tenho a certeza
              de que todas as coisas estremeciam
              só de murmurar o teu nome
              no silêncio do meu coração.
              Não temos já nada para dar.
              Dentro de ti
              não há nada que me peça água.
              O passado é inútil como um trapo.
              E já te disse: as palavras estão gastas. 
Adeus.
Eugénio de Andrade
Volta FIFOCAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!
ResponderEliminar